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RGPD: o direito à privacidade de dados

24/08/2019 | Ana João Sepulveda socióloga

RGPD e 50+ - iStock RGPD e 50+ - iStock

Faz agora um ano que entrou em vigor o Regime Geral de Proteção de Dados (RGPD). De maio de 2018 para cá muito pouco mudou na vida dos cidadãos, habituados que ficámos a dar a autorização para ter acesso à informação, utilização de cartões de fidelidade, cookies e outros semelhantes. As grandes alterações deram-se mais ao nível interno das organizações do que, propriamente, no dia a dia das pessoas.

Na sua essência o RGPD, chegou para garantir o direito à privacidade dos dados e o direito ao esquecimento, num mundo cada vez mais digital, onde o big data é uma preciosa fonte de informação para as organizações num mundo de economia de valor.

O rasto de dados que deixamos nas interações que fazemos online, seja em que plataforma for, nos pontos de pagamento e outros locais por onde passamos e interagimos é imenso. De tal forma que se torna possível saber, quase ao pormenor, o que fazemos, com quem, onde e quando.

Mais ainda, torna-se possível antever comportamentos, necessidades e motivações, o que nos facilita em muito a vida, mas que também retira muita da nossa privacidade. Um conceito, aliás, com significados ligeiramente distintos para as gerações mais novas e mais velhas. Isto para dizer que as pessoas das gerações 50+, muitas vezes menos digitais, tendem a ser mais ciosas da sua privacidade do que as mais novas.

Valor percebido vs. privacidade

No presente, e em grande parte graças ao impacto social do RGPD, as pessoas tem mais clara a relação valor percebido versus privacidade de dados. Ou seja, está mais evidente que há uma equação que conjuga o nível de privacidade de que estamos dispostos a abdicar e o valor percebido do bem que vamos adquirir.

Todavia, quando falamos em direitos e cidadania em Portugal, é importante perceber que ainda existe um grande segmento da população que não só desconhece os seus direitos e deveres, como também é infoexcluído e que, por isso, não tem uma noção clara do tipo de dados que está a partilhar e muito menos o tipo de uso que as organizações podem fazer desses mesmos dados. Daí que seja contribuir para a criação de uma nova mentalidade integradora e que fomente o respeito pelo cidadão dos escalões etários mais avançados e, em casos específicos, mais fragilizado.

Muito do desenvolvimento da economia da longevidade faz-se no cruzamento do avanço tecnológico com as necessidades na área da saúde, seja na perspetiva da prevenção, seja na perspetiva da melhoria das condições de vida numa situação de dependência, parcial ou total.

Visões estereotipadas

A fragilidade do cidadão/cliente/consumidor 50+ torna-se ainda maior quando persiste uma visão estereotipada que o minimiza e infantiliza e que, no limite, nega o seu lado de ser humano digno.

Esta forma de ver o cidadão dos escalões etários mais avançados retira-lhe os seus direitos, transmitindo-os aos familiares, ao Estado e às organizações. Ora, voltando ao tema do RGPD, corre-se o risco de considerar desnecessário pedir a sua autorização para a recolha de dados pessoais, porque é um “velhote”, como se ouve muitas vezes.

“Ele nem sabe o que é, nem dá por isso, que mal vai fazer? É para o bem dele”. O objetivo deste artigo é, precisamente, atentar contra o uso destas formas de estar, ver e pensar a pessoa com mais idade.

Uma pessoa não perde os seus direitos com base na idade ou por ser mais ou menos dependente e, muito menos, no livre arbítrio dos outros. Isto só acontece quando o tribunal declara determinada pessoa como estando incapacitada para decidir sobre si e sobre a sua vida, passando a ser o seu tutor a decidir. Todavia, na rotina dos dias corremos o risco de nos “esquecermos” disto.

O conceito da Organização Mundial da Saúde para a cidade Age Friendly contempla o direito a exercer a cidadania como um dos fatores base, ou seja, um ambiente que é amigo de todas as gerações e que garanta o pleno exercício da cidadania.

Ora, é neste sentido que importa sensibilizar os cidadãos para o que é o RGPD e para o que implica em termos de autorização para uso de dados pessoais, mesmo para o caso mais extremo que é o direito ao esquecimento, ao “apagamento”.

A privacidade é um direito de todos, independentemente do sexo, da idade, da cor de pele, da religião e do estado civil. O RGPD surge para garantir isso e impedir os abusos éticos do uso dos dados pessoais.